
Já precificado, à espera de novas isenções ou com temores de mais tarifaços no radar?
Nesta quarta-feira (6), entra em vigor o tarifaço de Donald Trump totalizando 50% para produtos brasileiros, mas com 694 produtos na lista de exceções, que contém uma tarifa de “apenas” 10%.
Para Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, como a entrada em vigor do tarifaço não é uma novidade, ele já está totalmente precificado nos ativos. “Claro que modificações podem ocorrer em breve, à medida que, em outros momentos, Trump já voltou atrás sobre a imposição de tarifas”, pondera, com negociações para que outros setores – como café, frutas e carne – fiquem livres da tarifa adicional de 40%, enquanto há pacotes de ajuda do governo no radar.

Já a Ágora Investimentos apontou que a entrada em vigor do tarifaço poderia limitar o entusiasmo dos investidores.
Uma dúvida que prevalece no mercado é se haverá novas isenções para a tarifa de 50% dos EUA a serem anunciadas pelo presidente Donald Trump. Cerca de 36% das exportações do Brasil aos EUA estão recebendo a taxa de 50% no momento.
Os investidores ainda ponderam se haverá reação de Trump à decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de determinar na segunda-feira a prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, por violações de medidas cautelares impostas a ele.
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Quando anunciou a tarifa sobre produtos do Brasil no mês passado, Trump vinculou a medida, entre outros assuntos, ao tratamento que Bolsonaro vinha recebendo do STF em seu julgamento por tentativa de golpe de Estado.
“Um ponto de preocupação é que as sanções recentes dos EUA e as tarifas foram explicitamente vinculadas a insatisfações em relação a processos judiciais no Brasil. Então, investidores temem que possa haver novas escaladas das tensões”, disse Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX.
Neste cenário de possíveis reviravoltas, algumas ações da B3 foram bastante impactadas, enquanto outras, apesar de uma primeira leitura negativa para os ativos, acabaram por se recuperar (ainda que com algum efeito do tarifaço sendo sentido).
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Confira abaixo quais ações já se abalaram e o que esperar para os ativos:
Embraer (EMBR3): do caos ao ânimo
As ações da Embraer se destacaram em meio às últimas reviravoltas de Trump. A princípio, após o anúncio de 10 de julho, a visão era de que a companhia seria tarifada em 50%, o que levou a uma grande mobilização em busca da isenção dos produtos exportados da fabricante de aeronaves. A avaliação era de que as tarifas de 50% impactariam o EBIT (Lucro antes de juros e imposto de renda) da Embraer em 35% em 2025 ou cerca de 60% em 12 meses.
No dia 30 de julho, a ação passou por uma montanha-russa na Bolsa. EMBR3 chegou a cair forte com a notícia de que Donald Trump, presidente dos EUA, havia assinado o decreto que implementa tarifa adicional de 40% sobre o Brasil, totalizando 50%. Porém, a divulgação de um novo documento apontando que a companhia estaria livre dessa tarifa adicional fez o papel disparar 10% apenas naquela sessão.
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Mais do que isso, suscitou análises de que os papéis poderiam novamente renovar máximas depois de se livrar do pior do tarifaço.
Após divulgar o balanço do 2T, a companhia disse que os resultados do segundo trimestre não foram materialmente impactados pelas tarifas aplicadas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros. Porém, projeta que o impacto da tarifa norte-americana de 10% no setor de aviação brasileiro seja de US$ 65 milhões ao longo de 2025. Deste total, 20% já foram realizados até o 2T25.
O presidente-executivo da Embraer, Francisco Gomes Neto, disse ainda que a empresa está em contato com as autoridades do Brasil e dos Estados Unidos e segue trabalhando nas duas frentes para voltar à alíquota zero.
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A companhia anunciou no dia 5 que, em busca de zerar tarifas, pretende investir até US$ 500 milhões para produzir o KC-390 nos EUA, caso o país compre o avião cargueiro. Um montante do mesmo valor será investido nos próximos cinco anos na expansão das instalações da empresa na Flórida.
… já a WEG, com duplo impacto
Por outro lado, não houve tanto alívio para a WEG (WEGE3), que ainda sofreu um duplo impacto uma vez que, no mesmo dia da publicação do tarifaço de 50% e da lista de exceções para o Brasil, os EUA também impuseram uma tarifa de 50% sobre diversos produtos de cobre — incluindo tubos, fios, vergalhões, chapas e tubos — e também sobre derivados com alto teor de cobre, como cabos, conectores, conexões e componentes elétricos.
Além disso, embora alguns produtos tenham sido excluídos, o entendimento era de que os motores de baixa tensão da WEG não estariam isentos e, portanto, serão totalmente afetados pelo acréscimo de 40%.
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“Com base em nossas estimativas, a tarifa adicional de 40% sobre importações brasileiras implica um impacto de custo de aproximadamente R$ 1,1 bilhão (cerca de 12% do Ebitda, ou lucro antes de juros, impostos, depreciações e amortizações, projetado para 2025)”, avalia.
A tarifa de 50% sobre o cobre adiciona ainda um impacto estimado de R$ 1,2 bilhão (cerca de 13% do Ebitda projetado para 2025), totalizando cerca de R$ 2,3 bilhões (cerca de 25% do Ebitda esperado para 2025).
O banco apontou esperar que a WEG implemente medidas de mitigação para compensar parcialmente essas pressões.
Durante a teleconferência de resultados do 2T, a administração da WEG destacou a estratégia de redirecionar exportações para clientes dos EUA a partir do México e da Índia, enquanto a produção no Brasil passaria a atender prioritariamente os mercados brasileiro e mexicano. A empresa também avalia reajustes de preços e o uso de fábricas mais próximas dos EUA, embora essas alternativas exijam tempo de execução.
“Ainda assim, algum impacto de curto prazo parece inevitável. O redirecionamento da produção brasileira impõe desafios operacionais e logísticos e, mesmo quando viável, pode provocar custos maiores — como rotas de envio menos eficientes (ex.: da China para os EUA)”, apontou a casa.
Além disso, embora a WEG tenha ganhado acesso à capacidade produtiva da Regal nos EUA, a sobreposição de portfólio ainda é limitada nesta fase inicial de integração. No segmento de motores, um risco adicional provável é a perda de participação para concorrentes com maior conteúdo local, como sua principal rival, a ABB.
Quanto ao cobre, a WEG mantém uma política de hedge que protege contra a volatilidade de preços no curto prazo. “No entanto, se os preços permanecerem elevados devido às tarifas prolongadas, ajustes nos preços dos produtos finais podem se tornar necessários. Vale destacar que esses impactos também podem atingir outros players do setor, como ABB e Nidec, embora a magnitude dependa do grau de exposição e da estratégia de proteção adotada por cada um”, avalia.
Mais bens de capital atentas ao tarifaço…
Roberto Simioni, economista-chefe da Blue3 Investimentos, também aponta a Tupy (TUPY3) como afetada, por ser uma das maiores produtoras de componentes fundidos de ferro do mundo, com uma forte presença nos EUA.
O Bradesco BBI apontou que a exposição ao mercado norte-americano é de 23%, sendo que entre 50% e 60% desse volume é exportado a partir do Brasil. Com isso, o banco estima que cerca de 13% da receita total da empresa pode ser afetada pelas tarifas, com risco de perda de competitividade.
Já a Randoncorp (RAPT4) pode ser impactada principalmente por meio da Fras-le, cuja exposição às exportações do Brasil para os EUA representa cerca de 5% da receita, e pela Master, avalia o BBI. No total, o BBI estima que 4% da receita consolidada da Randoncorp venha de exportações diretas para os EUA. No entanto, tanto a Randoncorp quanto a Fras-le possuem fábricas em território norte-americano, o que pode atenuar os efeitos das tarifas.
“A resiliência das empresas do setor dependerá de sua capacidade de adaptação e diversificação. Empresas com uma presença global e uma forte rede de produção em outros países estão em uma posição de vantagem para mitigar o choque”, reforça Simioni.
Alívio para a Suzano…
Outro setor que poderia ser bem abalado pelo tarifaço era o de celulose que, contudo, acabou registrando forte alívio por estar na lista de exceções. O Goldman Sachs apontou que a Suzano (SUZB3), classificada como compra, é a empresa com maior exposição aos Estados Unidos dentro da cobertura do banco, com cerca de 20% das vendas destinadas ao país.
A resiliência das empresas do setor dependerá de sua capacidade de adaptação e diversificação. Empresas com uma presença global e uma forte rede de produção em outros países estão em uma posição de vantagem para mitigar o choque.
Embora a celulose seja uma commodity de fácil redirecionamento logístico, o banco havia alertado para obstáculos comerciais e de cadeia de suprimentos no curto prazo, o que poderia afetar o sentimento dos compradores e pressionar os preços. A notícia é considerada um alívio para a estratégia comercial da Suzano e pode favorecer as negociações com clientes chineses.
O Morgan Stanley reforça essa avaliação ao lembrar que os Estados Unidos são fortemente dependentes da celulose de fibra curta cuja principal origem é o Brasil. De acordo com o banco, o país sul-americano respondeu por 38% a 39% das importações norte-americanas de celulose em 2024, o que explica a exclusão do produto da tarifa adicional de 40%.
Com isso, são reduzidas as chances de perda de participação para concorrentes com menor tributação, ao mesmo tempo que se alivia o custo para as indústrias de papel tissue e embalagens dos Estados Unidos.
A Klabin (KLBN11), também presente no mercado norte-americano, deve se beneficiar em menor escala. Embora tenha entre 1,8% e 2,5% da receita exposta aos EUA via celulose, grande parte dos seus produtos de papel e embalagem está sujeita à tarifa adicional, o que pode limitar os ganhos, segundo o Morgan.
… “susto” para os frigoríficos
Como já destacado acima, as carnes ficaram fora da lista de exceções de Trump, o que gerou um sinal de alerta para o setor. No dia 31 de julho, as ações de proteínas chegaram a ter quedas de até 10% com os ativos aparecendo como os maiores perdedores do tarifaço.
Contudo, uma segunda leitura apontou uma análise mais ponderada sobre o tema. O Goldman Sachs, embora reconheça que as tarifas possam trazer riscos macroeconômicos mais amplos, não prevê grandes implicações de curto prazo para sua cobertura para o setor – em parte porque o Brasil tem intensificado consistentemente seu comércio de commodities com a China.
A cadeia de suprimentos de carne bovina pode sofrer impactos moderados – 8% das exportações brasileiras vão para os EUA – e tanto as taxas de câmbio quanto as taxas a termo subiram após o anúncio. Nesse contexto, acredita que a Minerva (BEEF3) possa sofrer relativamente mais, especialmente em um contexto de expectativas de mercado crescentes antes da temporada de resultados do 2T25. Além disso, acredita que a JBS estaria relativamente protegida dessas dinâmicas, o que reitera as vantagens competitivas de operar uma plataforma multirregional.
A Marfrig (MRFG3) se manifestou sobre como será afetada pelo tarifaço e disse que as operações da companhia no Brasil continuam normalmente, sem interrupções nas linhas de produção e em plena capacidade. A companhia também destacou a ausência de “impactos na receita e na rentabilidade decorrentes dos efeitos da nova política tarifária dos Estados Unidos”.
Em comunicado ao mercado, a Marfrig esclareceu que “acessa o mercado dos Estados Unidos por meio de suas operações no Uruguai e Argentina e que as exportações para o país totalizaram 27 mil toneladas em 2025”.
Outras ações do agro no radar
Simioni também destaca possíveis impactos para as ações de outras empresas agro, dado que o açúcar não foi para a lista de exceções. Cosan (CSAN3) e São Martinho (SMTO3) são as mais expostas. “As empresas terão que redirecionar a produção para mercados alternativos como Ásia e Oriente Médio, onde há maior concorrência e preços mais baixos”, avalia. Além disso, o redirecionamento da produção pode gerar excesso de oferta em outros mercados, pressionando os preços globais.
Petroleiras beneficiadas, mineradoras e siderúrgicas com impactos limitados
O setor de energia, fundamental para a economia global e a segurança energética dos EUA, foi um dos beneficiados pela isenção de tarifas elevadas, destaca Simioni, da Blue Investimentos, apontando a Petrobras (PETR4) como a principal beneficiada.
“Como a maior exportadora de petróleo e derivados do Brasil, a manutenção do acesso irrestrito ao mercado americano garante a continuidade de uma importante fonte de receita e estabilidade para a empresa”, apontou o economista.
Já o Bradesco BBI ressaltou que a PRIO (PRIO3) foi a empresa mais afetada pelas sanções, com 13% do faturamento. Ou seja, também é beneficiada com o alívio das sanções.
A exposição direta das companhias brasileiras ao mercado norte-americano é considerada baixa, o que reduz os riscos imediatos para os balanços. Ainda assim, os analistas alertam para efeitos secundários, como pressões sobre o câmbio e o aumento da percepção de risco no cenário doméstico.
CSN (CSNA3), CBA (CBAV3) e Vale (VALE3) são as empresas com maior exposição (ainda que em níveis baixos), enquanto Aura (AURA33; pela exposição ao ouro) e Gerdau (GGBR4; dada sua exposição doméstica ao mercado de aço nos EUA) devem ser as menos impactadas.
De olho em varejistas
O setor de calçados e vestuário, com uma alta exposição ao mercado americano, é afetado pela imposição de tarifas de até 50%. “Essa barreira tarifária, que se soma aos custos de produção e logística, torna os produtos brasileiros muito menos competitivos em relação aos concorrentes asiáticos e europeus”, avalia Simioni.
Na ocasião do primeiro anúncio do tarifaço de 50%, Bradesco BBI, XP Investimentos e JPMorgan apontaram que o impacto direto tenderia a ser pequeno, mas não se descartava volatilidade nos papéis diante da elevação do risco percebido.
Segundo o Bradesco BBI, apenas duas companhias listadas do varejo apresentam algum nível de exposição relevante às exportações brasileiras para os Estados Unidos. A Azzas 2154 (AZZA3), dona de marcas como Farm e Reserva, possui 7% das vendas concentradas no mercado norte-americano.
Contudo, a produção da marca é majoritariamente feita em países como China, Índia, Turquia e Portugal. Apenas cerca de 3% das vendas totais da companhia estariam de fato em risco, concentradas no segmento de calçados femininos, segundo o banco.
Já a Alpargatas (ALPA4), fabricante das Havaianas e controladora da norte-americana Rothy’s, tem 4% das vendas ligadas ao mercado dos Estados Unidos. A operação da Rothy’s, por sua vez, é inteiramente baseada na China, sem produção brasileira. Apesar do peso reduzido sobre o faturamento, o Bradesco BBI diz que a elevação da percepção de risco pode afetar o desempenho de ações relacionadas a estratégias com longo prazo de maturação ou atuação internacional, o que pode incluir as duas empresas.
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