(FOLHAPRESS) – Aliados do presidente Lula (PT) avaliam que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), tenta se desviar das críticas geradas pelo tarifaço de Donald Trump ao projetar uma imagem de possível negociador com os Estados Unidos.
Eles veem o encontro desta sexta-feira (11) de Tarcísio com o chefe da embaixada dos Estados Unidos, Gabriel Escobar, como um movimento nesse sentido, e há ceticismo na hipótese de que o governador possa ser aceito por Washington como um interlocutor.
Para o Palácio do Planalto, Tarcísio, que já usou boné com o lema de Trump, está sob forte pressão desde a sua reação inicial à tarifa.
O governador já havia compartilhado, dias antes, publicação na qual o líder americano defendeu Bolsonaro e disse que ele deveria ser julgado apenas pelo povo brasileiro, numa crítica ao Judiciário.
Na quarta (9), dia em que Trump confirmou a sobretaxa, associando o ato a uma suposta perseguição judicial contra Bolsonaro, Tarcísio buscou relacionar o tarifaço à postura política de Lula, como “prestigiar ditaduras, defender a censura e agredir o maior investidor direto no Brasil”.
Com a crise em proporções mais claras e reações negativas do setor empresarial consolidadas, Tarcísio adotou já na quinta (10) outro tom. Passou a falar em “diálogo” e “negociação”. Ele manteve o discurso após se reunir com Escobar, quando disse ser preciso negociar e que “narrativas não resolverão o problema”.
Auxiliares de Lula viram no encontro mais uma tentativa de aplacar as críticas do que um esforço de intermediação sério.
A primeira razão seria que Tarcísio não tem as mesmas atribuições do governo federal para se engajar numa tratativa comercial com outro país, que envolve troca de ofertas de reduções tarifárias. Nas palavras de um ministro de Lula, ele não tem caneta para liderar uma negociação.
A segunda, que Escobar nem sequer é embaixador. É um funcionário longe do círculo de poder que hoje controla a Casa Branca e, nessa avaliação, o movimento de Tarcísio seria inócuo do ponto de vista prático.
Aliados de Trump têm exigido o fim dos processos judiciais contra Bolsonaro e das ações de regulação das big techs, temas também fora da alçada do governador.
Ainda segundo auxiliares de Lula, os esforços de Tarcísio para recalibrar seu discurso no tema das tarifas por enquanto têm sido pouco efetivos e aprofundaram atritos com o STF (Supremo Tribunal Federal) e com a base bolsonarista.
Um ministro afirmou que Tarcísio tenta se apresentar como salvador da pátria, mas sem credenciais políticas para a tarefa, podendo implodir pontes com setores que hoje o apoiam.
Como revelou a coluna Mônica Bergamo, da Folha, Tarcísio telefonou para ministros do STF e propôs que a corte autorizasse Bolsonaro a viajar para os EUA para se encontrar com Trump.
O argumento era de que o ex-presidente teria capacidade de negociar com o americano uma pacificação com o Brasil, arrancando dele a redução da tarifa.
Magistrados consideraram a ideia totalmente fora de propósito. Colaboradores de Lula, por sua vez, classificaram como gravíssima a iniciativa por verem nela uma possibilidade de fuga do ex-presidente.
Em outra frente, o deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos EUA para fazer lobby por sanções contra Moraes e o governo Lula, vinculou qualquer negociação sobre as tarifas a uma “anistia ampla, geral e irrestrita”.
A publicação foi interpretada como uma resposta aos apelos de negociação feitos por Tarcísio.
“Lamento, mas não dá para pedir ao presidente Trump –e nenhuma autoridade internacional minimamente decente– para tratar uma ditadura como se fosse uma democracia. Ou há uma anistia ampla, geral e irrestrita para começar ou bem-vindos à ‘Brazuela'”, escreveu Eduardo.
A publicação foi lida ainda como uma amostra da encruzilhada em que Tarcísio se encontra, tendo que se equilibrar entre o bolsonarismo, os interesses do empresariado paulista e até mesmo o Judiciário.
O ex-apresentador Paulo Figueiredo, outro bolsonarista que tem articulado nos EUA as sanções contra o governo Lula, disse nesta sexta que Tarcísio “atrapalha sem nem saber”.
“Enquanto o sistema tiver esperanças de que ele surja como o salvador da pátria intermediando um acordo com os EUA, não vão nem cogitar aquela que é a única solução real: a anistia ampla, geral e irrestrita.”
Na avaliação de um assessor palaciano, Tarcísio falhou em seu primeiro teste nacional e viu expostas suas contradições.
O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirma que ele tentou se diferenciar do bolsonarismo e exercer um protagonismo, mas é tarde demais. “Até na ditadura prevalecia o nacionalismo. Hoje, não. São subservientes”, disse.